Hoje uma mulher vestida pobremente me estendeu a mão na rua. Eu estava apressada, à caminho do trabalho e a minha primeira reação foi passar por ela resmungando uma desculpa. Mas quase que imediatamente, olhei o sol - filtrado em tons de rosa e dourado, através da figura meio desgrenhada que se impunha à minha frente.
Num relance, percebi a bela rua em que ambas estávamos naquela começo de tarde : as árvores que ondulavam castanhas, com suas flores de primavera. Os pássaros que no mesmo instante cruzavam o céu em revoada. Senti na pele o doce alento da brisa que nos envolvia, e me dei conta dos traseuntes - que distraídos, compartilhavam conosco aquele instante de magia e beleza que se desenrolava.
O movimento pulsante da vida, a orquestra silenciosa dos dramas que iam e vinham, o milagre de estarmos reunidos todos ali : carros, pássaros, cachorros vagabundos, almas .Cada qual em busca do seu sustento, seu amor, seu alento, sua promoção no trabalho ou - como aquela mulher - um pedaço de pão.
Naquele tempo fugaz, éramos duas mulheres caminhando na mesma cidade, no mesmo mês dia e ano,com idades próximas, mãos iguais.Carregávamos nos olhos alegrias e tristezas. Ela estava com fome e eu também - era hora do lanche.
Ela tinha uma história , talvez amores, filhos, sonhos - tanto quanto eu. Então sorri, pedi que ela esperasse. Entrei na padaria em frente, comprei um lanche para nós. Convidei-a a sentar-se comigo na praça ...e posso lhes dizer uma coisa ?
A mulher mal arrumada que me pedira um pão, tinha histórias maravilhosas para contar.
Estava na cidade de passagem, ia à Aparecida do Norte cumprir uma promessa.Vinha de um sítio em Valença, onde morava - movida pela fé e pela liberdade.
Apreciamos muito a companhia uma da outra, e ela me contou sobre sua casa (num lugarejo próximo) , que era lavadeira e tinha muitos amigos .Com olhos brilhantes de orgulho, contou-me que criava muitos animais que achava abandonados - e os acolhia, banhava e alimentava.Me disse por fim, que era muito feliz, e que a pobreza nunca tolira nenhum de seus sonhos...Ia agora, ver a maior Igreja do Mundo, porque era uma coisa que sempre desejou fazer e que se pôs a caminho - porque uma sobrinha se ofereceu para cuidar dos animais, enquanto estivesse fora.
Eu também falei sobre meus sonhos, meu trabalho e meus bichos - e rimos felizes de nossas histórias. Ao final do lanche, nos despedimos : apontei para a Biblioteca onde trabalho e disse que se por acaso ela voltasse pelo mesmo caminho me procurasse ali.
Ela se admirou olhando a fachada da Biblioteca e exclamou :
_"Que sorte a sua trabalhar entre livros ! Também tenho sorte, porque trabalho com a água...São coisas mágicas, que estão se acabando...
E como se fosse um segredo, sussurrou : "Somos abençoadas !"
Assenti.E achei essa observação a coisa mais sensível e bonita que ouvi nos últimos tempos...
Boa Viagem minha Nova Amiga, Você me Fez Muito Bem !
( suian moreira)